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A SAGA DE UM QUARENTÃO - Parte II

 
(continuação)

Chorei copiosamente. Parecia uma criança que teve o doce roubado ou que levou um cascudo do pai quando mexeu nas suas revistinhas de sacanagem.

Desliguei a TV e tive vontade de quebrar aquela maldita por ela ter me dado aquela notícia tão triste. Dominei o meu ímpeto porque a minha tão sonhada 29” tela plana, tinha custado uma grana e foi financiada em 12 prestações das quais ainda faltavam pagar 10 parcelas que, certamente, não seriam pagas porque eu morreria antes.

Chorei todas as lágrimas que um ser humano pode chorar. Tive a sensação que minhas glândulas lacrimais abandonaram o meu corpo porque não poderiam mais cumprir com a sua sagrada missão: produzir lágrimas. A esta altura a dor nos culhões era tão grande que eu já não conseguia andar direito, parecia que eu estava carregando um peso de 100kg nas costas.

Eram 3 horas da manhã e faltavam 2 horas para o dia amanhecer. Como eu explicaria para minha mulher e para os meus filhos a razão daquela cara inchada de tanto chorar? Comecei a pensar na vida. Achei que Deus estava sendo injusto comigo. Porra! Tudo bem que eu já fui da pá virada. Já amarrei bombinha no rabo do gato, já roubei farofa de pai de santo, já roubei vinho na sacristia, já fugi do restaurante sem pagar a conta, enfim, já fiz uma porrada de coisas ruins, mas agora eu to regenerado. Sou um cara bacana. Distribuo balas no dia das crianças, ajudo a comunidade nos mutirões, divido a marmita com os mendigos, levo a minha sogra para passear e até aprendi a rezar. Será que o cabeludo lá em cima não tá vendo isso?. To lutando, no sapatinho, pra salvar a minha alma e aí vem Ele e me dá uma rasteira. Você concorda que isso é injusto? Ou será que Ele está querendo me dar um corretivo. Talvez a idéia Dele seja me dar um banho de mel e me deixar, pelo menos 24h, sentado em cima de um formigueiro. Porra, cara, imagina aquelas saúvas gigantes, tipo tanajura, cravando o ferrão no meu saco que já está todo dolorido. O lado bom desse castigo é que eu vou pagar todos os pecados que já cometi e ainda vou ficar com crédito para compensar nas futuras traquinagens.

Sem esconder minha tristeza fiz um último apelo, ao meu bom Deus, para que Ele não deixasse os meus filhinhos órfãos de pai. Chiquinho, Creuzinha e Marcelinho, 2, 5 e 9 anos, respectivamente. Penso também na Verinha, minha fiel esposa, um encanto de mulher, bonitinha, corpinho nota 10, não é uma Camila Pitanga, mas chega perto, apesar dos 3 filhos, todos de parto normal, mais para mim, continua uma eterna virgem, extremamente sensual, carinhosa, delicada e gostosa. Na cama, uma tremenda astronauta com vaga garantida na NASA, graças a ela eu pude conhecer o Sol, a Lua e as Estrelas nas viagens alucinantes em que ela me conduz com maestria nas nossas noites de amor. Coitadinha da minha pretinha se cair nas garras do Zeca pé de mesa, o garanhão do pedaço. Ele nunca se meteu a engraçadinho com ela porque sabe que eu arrebento a cara dele de porrada. Mas como defunto não bate em ninguém, o caminho vai ficar livre para o espertalhão. Imagina aquele monstro transando com a minha Verinha. O cara tem uma caceta igual àquelas que eu vejo nos sites eróticos e Verinha nunca viu isso. A única caceta que ela viu na vida foi a minha (se é que eu posso chamar isso de caceta) e a dos meus filhos. Quando casamos ela era virgem, eu fui o primeiro e único homem na sua vida e ela já está acostumada com o meu pintinho. Tomara que Verinha não caia no papo daquele tarado, se cair já era. Quando a trolha do negão começar a entrar minha pretinha vai chorar lágrimas de sangue. Vai gritar, espernear, tentar fugir e desesperadamente vai me pedir socorro, mas eu nada poderei fazer. O cara vai dividir Verinha ao meio. Meus Deus! Que horror! Nem quero pensar nisso!

Olho para o relógio e vejo que são 6 horas da manhã. Penso rápido e decido ir ao médico examinar minha próstata. Para não acordar Verinha vou até o varal, pego uma cueca limpa, tomo uma chuveirada, visto a mesma roupa e saio em silêncio com destino ao consultório do tal proctologista. A esta altura do campeonato, o meu saco doía menos ou então eu já estava me acostumando com a maldita dor. Mesmo assim, decidi ir de táxi para não fazer esforço que pudesse incomodar meus gloriosos culhões. Quando eu estava saindo no portão um vizinho passa de carro e me oferece carona. Ôba, legal, assim eu economizo o dinheiro do táxi para comprar os remédios. Agradeci ao Luiz e entrei no seu Monza vermelho. Que beleza! Aquilo é que é carro. Nem se compara com o meu Fiat - (F)ui (I)ludido (A)gora é (T)arde - 147 todo ferrado. Me senti "o cara" no banco daquele Monza vermelho.

Luiz era um cara muito discreto, religioso, caladão, caseiro e vivia só para a família e para a igreja evangélica que ele frequentava. Era um homem de Deus, como costuma dizer. Nunca vi o cara metido em bagunça. Aos domingos ele ia para a igreja de manhã e de noite. Em sua casa só se ouvia músicas evangélicas. Samba, pagode, forró, rock, hip hop, eram gêneros musicais que o seu aparelho de som recusava-se a tocar. Apesar de todo esse fanatismo ele era um cara gente fina e muito querido na vizinhança.

Como o Luiz é muito calado e eu, apesar de muito falante, também não conseguia falar sem provocar dores no saco, a viagem seguia em silêncio. Parecia que estávamos indo para um velório. Tentei “quebrar o gelo” para o tempo passar mais rápido:

- Luiz, - perguntei meio temeroso - tu sabe o que é câncer de próstata?

- Claro que sei, Chico. Meu pai morreu disso. Foi terrível. Dava pena ver o coitado gritando de dor. Quando ele morreu foi um alívio para todos nós, inclusive para ele.

- Puta que pariu - pensei comigo mesmo - Era melhor ter vindo de táxi ou ter mantido o silêncio.

O que o Luiz me falou fez o meu saco doer ainda mais.

- To ferrado, - pensei com tristeza - meu fim está próximo, preciso saber quanto tempo ainda tenho de vida.

Luiz quis saber a razão da minha pergunta e chegou a insinuar que eu estava com a maldita doença.

- Porque me perguntou isso, Chico? Você está com câncer na próstata? Se tiver vai lá na igreja domingo e vamos pedir uma oração para curar a tua doença. Se você tiver fé, vai sair de lá curado.

- To não, Luiz. To não. É que eu fiquei impressionado com uma reportagem que assisti ontem a noite na televisão. – falei tentando disfarçar o nervosismo.

Pela cara que ele fez, acho que não acreditou, mas ficou calado e eu comecei a pensar na possibilidade de acompanhar o Luiz até a igreja no domingo. Mas, por enquanto, resolvi dar uma chance a ciência antes de recorrer a Deus que deve estar muito atarefado tentando convencer o Congresso Nacional de que verba pública é dinheiro do povo e deve ser investida em benefício da nação e....bem deixa pra lá. Isso é uma outra história.

Luiz trabalha no IBGE, lá em Mangueira, e como se estivesse adivinhando que o meu saco doía, seguiu pela Av. Mal Rondon para me deixar na estação do metrô já que eu ia para o centro da cidade, pois o consultório do meu famigerado estuprador ficava na rua Uruguaiana.

Tudo bem, chegamos. Desci, agradeci e fui para estação do metrô pegar o trem. Para minha surpresa e indignação, quando o trem abriu a porta, dei de cara com o Zeca pé de mesa:

- Fala aí Chico. Ta abatido, cara, o que você tem? Ta doente, mano?

- Não, Zeca. – falei tentando disfarçar a minha dor - To cansado, cara. Virei a noite no plantão e estou até agora sem dormir.

- Não enche o meu saco que ele ta doendo muito – pensei.

- Vê lá, cara. – insistiu o engraçadinho - Te cuida, maluco. Vai dar mole e morrer deixando Verinha perdida nessa selva. Sabe como é mano...rapidinho chega um caçador para abater a caça.

(continua)

 
Autor
MagnoRobertoAlmeida
 
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