Neste mundo que se agita à minha frente num ensurdecedor ronronar da penumbra das faltas gostava de entender o porquê… gostava de entender porque é a vida tão deslavada, tão desfigurada, tão tempestuosa, tão miserável…
Hoje passei pelo portal da existência rastejando, ultrapassei as barreiras da realidade e subi ao cume das montanhas do irreal para louvar a espiritualidade e ter espaço para saltar em queda livre nas mãos do oco, do vago, do silêncio, do vazio, do abstracto… apercebi-me que a vida não é mais do que esta loucura súbita de sair de mim para cair no mais profundo do que sou, a densidade e intensidade de um momento solene que desfigura a vida e a torna abstracta e insensível porque é tão pouco e significa tanto ao mesmo tempo. Da vida não sei nada, a vida esfacelou-me o coração, perdi-lhe o jeito, enrosquei-me no seu pescoço e deixei-me ficar sem querer saber de mais nada, deixei-me estar…
Quando hoje vi o por do sol caindo no buraco da realidade senti o chão desfigurar-se como a vida se desfigura quando a procuro, senti-me cair em mim aos bocados, preso o coração na amargura de me saber viva na vida que não entendo… Agarrei-me a recordações que ardem dentro de mim, momentos únicos que a vida me ofereceu, momentos que me fizeram crescer e voltar a mim, sorri enquanto caía, sem medo enrosquei o meu corpo o mais que pude, lá em baixo a escuridão assusta, por cima de mim a luz entristece e afasta-se cada vez mais, olhos de felicidade por estar de volta a uma realidade que má ou boa é a minha…
Preciso sair de mim mais vezes para mergulhar no mais profundo do meu ser… A vida é este mar coberto de faltas e recheado de malvadez mas lá no mais intimo da nossa essência, se mergulharmos bem fundo, iremos encontrar razões para vir ao de cima de vez enquanto apenas para respirar bem fundo e mergulhar novamente o mais profundo possível, encontraremos a vida, agarraremos a vida… desfigurada… vida….
. façam de conta que eu não estive cá .