Poemas : 

Custa-me o sono que não chega

 
Custa-me o sono que não chega

Tinha perguntado aos oráculos pelas novas profetizadas há muito,
Diziam-me ser o escolhido nefasto mal que purificaria o mundo.
Dei-me por inteiro, abrasei as roupas quentes, despi a mortalha,
Lancei o véu em lamentos dormentes, custa-me adormecer,
Passo pelas noites antigas, recheadas de aves e sons estranhos,
Custa-me o sono intenso que não chega, que me consome os olhos,
Canso-me da nascente estagnada, de águas lentas e vorazes,
Que teimam em passar sob as pontes, que teima em fluir no sangue.
Sou selvagem por natureza e guerreiro por escolha infame,
Uma ave de rapina de tez negra e asas petrificadas no alado esvoaçar,
Um predador inocente, ávido da noite oculta, transformada em prazer.
Ando pelas areias molhadas que me queimam a pele na ilusão,
Percorro os trilhos da maré, cavalgo as rochas isoladas,
Vem-me ao rosto o nevoeiro, frio, calmo e morto,
No oceano deposito meu tesouro,
Estagno com as fontes no topo das montanhas e deleito-me com a inércia, canto-lhe uma canção torpe e parda, cinza e esquecida.
Faço um pacto com o vento, dou-lhe todo o meu saber,
Faço um pacto com a brisa, dou-lhe toda a minha dor.

 
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jomasipe
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Enviado por Tópico
Moreno
Publicado: 21/10/2009 09:13  Atualizado: 21/10/2009 09:13
Colaborador
Usuário desde: 09/01/2009
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Mensagens: 3482
 Re: Custa-me o sono que não chega
És selvagem neste pacto que tens a escrita, transformando-a num prazer para os leitores. Espero que também a ti te dê prazer escrever assim.

Abraço


Enviado por Tópico
Henricabilio
Publicado: 21/10/2009 09:17  Atualizado: 21/10/2009 09:17
Colaborador
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Localidade: Caldas da Rainha - Portugal
Mensagens: 6963
 Re: Custa-me o sono que não chega
Na aridez dos sentidos, o homem abre o seu peito.
No final uma questão ocorre:
Como saber o que é vento?!...
Como saber o que é brisa?!...

Abraçooo!
Abílio


Enviado por Tópico
HorrorisCausa
Publicado: 21/10/2009 12:46  Atualizado: 21/10/2009 12:46
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Localidade: Porto
Mensagens: 3764
 Re: Custa-me o sono que não chega
numa escrita como é hábito na 1ª pessoa não deixa no entanto de reter uma visão mais ampla que passa por todos nós, quando em noite de insónia somos tomados pelos calafrios das questões existenciais ou mesmo praticas sem resposta...instalam-se os cansaços.

beijo