Contos : 

Reservatório para onde escorrem os resíduos

 
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Passar onze anos da vida numa escola, depois que sai, você fica perdido. Estou assim sem rumo.

O Lampreia, aquele filho-duma-puta cabeluda, arrumou emprego. O cara é aleijado, por isso conseguiu entrou num trampo, e agora está conseguindo tirar uma grana boa. Acho que vou meter um tiro na minha coluna.

Dizem que temos livre arbítrio. Claro que temos, podemos escolher quem será nossos pais, escolher se vamos nascer ricos, pobres, aleijados — igual o Lampreia —, podemos, até mesmo, não ter o nome de Irenaldo. É esse meu nome.

Estou defronte à porta da casa do Lampreia. Darei parabéns a ele.

A porta abre-se.

"Parabéns, Lampreia, pelo trabalho!"

Uma das coisas que eu mais admiro no mundo é a hipocrisia. Pode acreditar, meu caro, nem todos estão preparados para ouvir de tudo. A hipocrisia preserva a paz, preserva o casamento; em suma, preserva a ordem social. É isso.

Ele sorri. Pede para eu entrar. Digo: "não!"

Vou para o Centro.

Sento num dos monumentos da Praça da Rodoviária. Há vagabundo, prostituta, traficante, noiado, há uns caras com uns rodos na mão e uns detergentes; detergente porra nenhuma!, é, na verdade, uma água suja cheia de terra. Tem outro cara puxando uma carroça. E, há também aqueles que tentam escapar dessa merda toda que eu disse aí atrás. Só te digo uma coisa, meu amigo, escapam temporariamente. Estamos todos na merda, eu você, eles, Ele; enfim, todos! Penso que Deus segurou o pau dele abriu a bunda de toda humanidade e mandou porra. Mandou a semente; aí nasceu merda, eu você e eles! Ele agora de pau mole vê toda a merda que fez. De pau mole, mas feliz; e você?, está feliz? Eu não.

Acendo um cigarro. Decido matar o Lampreia. É isso.

 
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flaviogustavo
 
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