Q’ saudades da minha rua
Nas manhãs de sol de inverno
Quando a brisa sopra fresca
Nas folhas soltas ao vento
Estrada abaixo até ao parque
Do nosso brincar tão terno.
Saudades são tantas, tantas
Dos amigos, reinações
Das corridas, das touradas
Num fazer de conta, lidas
Nos cornos das brincadeiras
E dos nossos corações.
Que saudades do Janeiro
E do Carlos gordo da Vila.
Do Zé Manel da tourada
Com dotes de carpinteiro.
Deste ainda guardo a espada
Na lembrança tão tranquila.
Saudades também de amigas
Divertidas prazenteiras
Lembro a Helena charmosa
E a Cecília… a mais gulosa.
As corridas em bicicletas
E os trambolhões pelas beiras.
São saudades pelas trindades
Da Vila do Campo Pequeno
Eram assaltos de garotos
Aos baloiços de gigantes
Investidas rumo aos céus
Sem horizonte terreno.
Saudades até dos jogos
Das mãos sujas das caricas
Atiradas nos lancis dessa rua
Decorada, a palmo analisada,
Por berlindes de mil cores
A rolar soltos de intricas.
Lavo as saudades nas pedras
Em cada Verão a caminho
Daquela rua sentida
Porta acima porta abaixo
Passagens para a liberdade.
Onde a amizade fez ninho!
ROQUESILVEIRA
------------------------------- em reflexo de:
RUA DA SAUDADE
Que saudades da minha rua
Nas tardinhas de Verão!
Quando a aragem brincava,
A esconder-se do calor,
E subia a calçada,
Direitinha do Marão!
Tantas saudades, tantas!,
Das sestas ao relentinho,
Ou na soleira da porta,
Aprendendo a bordar
Flores que minha mãe plantava
Em retalhos de branco linho!
Que saudades das Trindades
Em ecos na minha rua...
Quando aplacavam os suores,
Chamando aos doces lares
Afazeres de sol-a-sol,
Afagos de lua-a-lua!
Com as pedrinhas lavadas
Pela chuva de Verão...
Que saudades da minha rua,
Em subida para o céu,
Atapetada de flores
Em dias de procissão!
Que saudades da minha rua!
Dos Domingos soalheiros,
Quando os moços se vestiam
De lavado e bailarico,
E sua alegria enfeitavam
De namoricos brejeiros!
Tantas saudades me dá
Lembrar o ledo bulício
Da minha rua que era
Avenida Principal
Dum tempo em que minha aldeia
Era meu Mundo patricio!
Que saudades das vindimas,
Quando a azáfama era crescendo
Na calçada adocicada
Pelas lágrimas dos bagos
Sacrificados nas rodas
Dos carros de bois, tangendo...
E o aroma de açúcares
Ainda hoje os sinto assim,
No melhor cofre que guardo,
Junto com os sons do fado,
No altar de viva saudade
Que mora dentro de mim...
Hoje só o silêncio mora
Na minha rua esquecida...
As gentes negam-lhe os passos,
Preferem estradas e carros
E desdenham a calçada
Onde pisaram a Vida...
STEREA
Teresa Teixeira
(A calçada da minha rua é a subir e a descer...
... assim como a minha Vida, calçadinha de sofrer...)