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#31

 


. façam de conta que eu não estive cá .

diz-me: os rios nunca nascem mar. e eu penso que não quero ser rio, nem quero ser mar, nem quero nascer e calo-me. gostava de lhe mostrar a sombra dos afectos, o caudal dos gestos, as margens do amor, mas ela nunca gostou de coisas simples e eu sou feito de água. um dia descobrirá que debaixo da pele lhe crescem dores, nas articulações, nos órgãos, da boca ao coração, lentamente, até todo o seu corpo ser o cárcere que já é, e desconhecer-se.
diz-me: está frio. é outono. estou triste, ou o inverso, estou triste, é outono e está frio. eu inspiro as lágrimas à boca dos olhos e fujo, na pressa de fugir perco-me. quero morrer longe daqui, onde os dias curtos não me trazem dores, onde as árvores semi-nuas não me trazem semi-deuses, onde a voz dos pássaros migratórios me grita o amor.


podias ao menos ter-me ensinado a sobreviver à mudança das estações.
 
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Margarete
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Enviado por Tópico
Alexis
Publicado: 23/09/2009 00:07  Atualizado: 23/09/2009 00:07
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 Re: #31
lendo-te por aqui...lendo-te sempre maravilhada...

um beijo de água atravessando um muro e diluindo-se num lago de profunda empatia apesar de todas as distâncias,de todas as diferenças...

alex

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 23/09/2009 10:56  Atualizado: 23/09/2009 10:56
 Re: #31
Olá.

Muito interessante esta prosa.
A frase final faz o apanhado do texto excelente.

Mas a verdade é que a melhor aprendizagem é a que fazemos sós, por nós mesmos.

Abraço.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 23/09/2009 11:36  Atualizado: 23/09/2009 11:36
 Re: #31
Olá Margarete!

Gosto muito de prosa, é para mim mais real, menos fingidora. Sigo agora o que vais escrevendo, e gosto imenso.
Ainda estou a aprender a ler a tua escrita, esta coisa de perceber o que está atrás das palavras é sempre muito difícil e muitas vezes errático.

Um beijo
JLL

Enviado por Tópico
Caopoeta
Publicado: 23/09/2009 11:44  Atualizado: 23/09/2009 11:44
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 Re: #31
..todo o corpo é moldável e como tal tambem se despe e recorre a um pensamento volátil ,nao percebo, como tambem nao desejo a ninguem, a amargura dos dias.outras vezes foram mel ,agora resistem flores de plástico em vento gelo repirável.

beijo.