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Re: Poesia sem poetas?
Membro de honra
Membro desde:
24/12/2006 19:19
De Montemor-o-Novo
Mensagens: 3217
Lembram-se de Frankenstein? Ei-lo de novo.
A humanidade atingiu o seu pináculo quando inventou a escrita, algo que, de alguma forma, civilizou o mundo e lhe trouxe muitas chatices. O Homem aprendeu a escrever e a ler o que escrevia, aproveitou-se dos que não atingiram esse patamar.
Na era (mais) moderna a nova humanidade voltou a atingir o seu pináculo quando inventou o computador, uma forma de armazenar a já escassa memória humana, civilizou as guerras através de regras que não se cumprem, o que nos continua a trazer muitas chatices.
Alguns homens aprenderam a programar a vida dos outros que não sabem programar.
Numa era vindoura (que já começou) inventa-se o novo Frankenstein, a IA que não é mais que um pedaço de cada um de nós, perdemos a personalidade em favor de uma nova entidade, perdemos a capacidade de usar os escassos 10% do nosso cérebro porque estamos a criar um cérebro comum, que faz tudo por nós e que nos tira a humanidade... seremos vegetais no próximo futuro que vier.

A questão é: IA ou IH?

Criado em: Ontem 20:19:34
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Re: Poesia sem poetas?

Membro desde:
29/1/2015 10:19
De Betim - Minas Gerais - Brasil
Mensagens: 4914
Caríssimos.

Acerca do que se comenta sobre a I.A., percebo antes demanda por conteúdo básico do que efetivamente substituição do humano. Na fotografia, I.A. é utilizada para a edicção automática de instantâneos e mesmo quando é calibrada para obter resultados "artísticos" não alcança a complexidade da obra humana. É apenas "correta". Muita I.A. tem sido utilizada nas artes plásticas para gerar imagens de rápido consumo e muita tradução capenga inunda as páginas da web para transmitir informações rápidas-mas-superficiais. Se os poemas escritos por I.A. parecem relevantes é antes pelo olhar do leitor do que pela profundidade de arrazoados e efeitos de linguagem que obtém.

I.A. é importante porque nunca se consumiu tanto conteúdo em texto, imagem e som.

Há mais consumidores de conteúdo espalhados pelas redes sociais do que ideias e sentimentos a transmitir honestamente.

A arte de escrever em versos deve atrair menos atenção dos programadores de I.A. do que as áreas que mencionei, mas mesmo que eventuais escritores de última hora recorram à I.A. para desembolar uns versinhos para a namorada ou votos para uma cerimônia de casamento, nada de novo isso seria. O mesmo em se tratando de escritores profissionais que passam para aprendizes ou pupilos as encomendas que não têm muita paciência ou motivação em atender. Muita coisa se escreve para eventos e só tem valor n'aquele instante. Posso parecer pedante, mas sempre me repugnaram versos de ocasião. Jamais escrevi porque tinha-de escrever — poesia, ao menos — mas entendo que muitos não tenham ou não queiram ter essa escolha.

Para muitos, a motivação do dinheiro é essencial para sua arte. Trabalhei muitos anos com uma fotógrafa que era sobretudo motivada em sua arte pelos contratos que firmava. E havia arte legítima ali, no sentido de que a intenção de promover transmissão de ideias e sentimentos acontecia e causava impacto sobre o apreciador daquela fotografia. O uso da I.A. no trabalho dela ampliou exponencialmente sua produtividade e penso ser por isso que a I.A. seja tão sedutora.

Em arquitetura, o mesmo acontece. Muitas das etapas do projeto acompanhavam o desafio de representar o edifício em desenho. Com a I.A. desenvolvendo a ideia básica do arquiteto e gerando automaticamente uma infinidade de desenhos, o processo criativo muda e fica concentrado na ideia original. A produtividade aumenta muito, mas a capacidade de "amadurecer" a ideia original se torna rarefeita. Tendo a ver muita arquitetura audaciosa mal resolvida por esse método produtivo, mas não tenho dúvidas que talvez tenha de ser assim mesmo, em vista da grande demanda de trabalho que se cria diariamente em tudo o que fazemos.

A poesia, portanto, se salva da I.A. por sua desimportância econômica. Há mais gente escrevendo poesia do que gente pagando por poesia, ao contrário da fotografia e das artes plásticas ou mesmo dos roteiros de historinhas promocionais que encaramos o tempo todo nas redes sociais. Não lamento que a reportagem de uma fofoca seja escrita por uma máquina. Se é quase irrelevante, para quê ocupar uma pessoa com a redação de um texto de 3 frases?

Na verdade, frequentar sítios como o lusos se torna mais interessante como uma ilha de humanidade cercada por oceanos de produção escrita imediata.

Se fizerem poesia sem poetas também no lusos, acredito que os livros de poesia dos séculos passados ainda devem nos alertar sobre o carácter personalíssimo da escrita em versos.

É isso.

Abraços, RicardoC.

Criado em: Hoje 12:37:20
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