Estou sem palavras.
Adeus, amigo Júlio

POEMA
esgotadas todas as possibilidades de respirar
abro sem medo os meus olhos para a morte
meus barcos pedem paciência aos ventos
a tempestade de um dia agora parece tão calma
o silêncio me ensina o evangelho segundo os peixes
sem querer então me descubro rezando
diante de um altar de algas e espumas

não sinto cansaço ainda que me falte o ar
e ressuscito memórias velhas mas tão velhas
que me torno menino de novo a correr sem parar
o peso das marés que tenho nas costas não me incomoda
uma gaivota amiga me empresta o seu voo

(Júlio Saraiva, 7.12.2012)

Até sempre, Júlio.

DM

até já mano Júlio...

beijo
c.

Carta ao poeta Júlio Saraiva

Troquei o dia por miúdos. Fiz-me rápido ao tempo para chegar a tempo a um funeral.
Revi amigos por causa disso, mas senti-me estranhamente só durante todo o dia, mesmo que me tivesses acompanhado no caminho empedrado até ao cemitério.
De te ter pedido lume e teres retirado com as mãos duas pedras da calçada.
Mais tarde, haverias de te embebedar comigo no meu bar de se...mpre, num dia em que me senti estranhamente só.
Tentei dizer-te enquanto bebíamos, alguns poemas que tinha decorado, coisas sem tempo, mas rompi propositadamente os bolsos da alma antes de sair de casa.
Foi por isso que passaste despercebido a um poeta que me pediu satisfações, apertando-me longamente a mão.
Lembras-te de quase te ter pedido desculpa, pouco antes de sairmos, estava o Alcino a tocar no pátio do Álvaro a guitarra que trazia incorporada nos dedos?
Sabes que me parecia samba o fado?
E que por causa disso, me apeteceu abraçar-te de tão zangado que estava contigo?
A discussão da noite anterior deixou marcas de batom na amizade que sentíamos um pelo outro.
Pensavas tu por acaso, que não amava da mulher brasileira a sensualidade, o encanto?
Acaso chegaste a supor que seria capaz de denegrir a pele morena, o cheiro a mar, o bailado dos seus sorrisos?
Sinto-me profundamente só hoje, Júlio.
Só de te ter trazido comigo durante todo este dia em que me fiz rápido ao tempo, para chegar a tempo a um funeral.
Morreu o pai do Faria.
Um dos polícias que investigou a morte de Maria Cura, personagem central de um romance que escrevi.
Meu amigo.


José Torres - Carta escrita e publicada no site Luso-poemas em 27-05-2010

Olá Caio,

só agora cheguei e acionei a net. Fiquei triste com a notícia e sei que a morte precoce do poeta Júlio comove todos que o amavam e admiravam. Agora é o céu que está em festa, todos os poetas recebendo seu semelhante... Neruda, Auden, Drummond, Vinicius ... e o Júlio.


Um abraço



- fiquei mais 'ligada' com o comentário que coloquei, lá atrás ,no teu texto da 'saudade'... nunca queria essa verdade tão dorida.

Até sempre.
Guardo-o em respeito e admiração.

Júlio,
Recebe, onde quer que estejas, um abraço da tua amiga a quem carinhosa e respeitosamente chamavas - Maria Fernanda.
Nanda