Comentário a "Cores ímphares", de Vania Lopez |
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Administrador
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2/10/2021 14:11 Mensagens:
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"Cores ímphares", de Vania Lopez por cá o céu anda bocejando numa menstruação de nuvens apliquei nele umas tatuagens de estrelas pra dar um charme no quintal depus um silêncio de giz numa referência à seus olhos uma lamparina na varanda não faltam sombras tuas velejando no pensamento vou arar o oceano deixar tudo límpido pra gente sujar com cores ímpares não sei se a noite virá amanhã mas se vier venhas com ela traga algo para ansiar com tudo que é adiado o portão já está florido para o eco dos seus dedos ----------------------------- Percurso de leitura nº 26 (se quiser conhecer os anteriores, fica aqui o link) Já não é a primeira vez que Vania Lopez introduz no título de um poema alguma palavra que inclui a letra 'h'. Para além de chamar à atenção, trata-se de um recurso curioso, que nos faz pensar sobre a função desta letra, que pode ou não transformar sons. Vejam-se, a título de exemplo, os poemas anteriores "Phome" (em que o 'ph' assume claramente o som 'f') ou "Phequenos quases" (em que o 'h' tem um efeito sonoro nulo, mas visualmente parece remeter para uma versão mais antiga da língua, em que a fonética não era necessariamente determinante na grafia da palavra, como se tentou fazer a partir dos diversos Acordos Ortográficos, desde final do séc. XIX até 1990). Há, claro, um lado lúdico e expressivo nesta marca linguística, que torna reconhecíveis os poemas desta autora, uma espécie de antecâmara para o estilo muito peculiar desta poeta. Ainda no título, destaco o duplo sentido do termo 'ímpar'. Por um lado, temos o sentido de algo que não é comum, que é invulgar ou peculiar; por outro, um algarismo que não é par. Se restringirmos a palavra 'par' ao significado de 'conjunto de duas pessoas', consideraremos ímpar o número um (uma referência à solidão?), ou três (que pode ser, de certa forma, uma multidão, ao falar de um par amoroso, por exemplo). E, de facto, é de solidão que falamos: o "silêncio de giz", as "sombras tuas", o pedido de encontro no final do poema – tudo aponta para a ausência e para a solidão. Perante essa ausência do 'tu', a vida corre aborrecida (a personificação do "céu" que "anda bocejando" é um bom exemplo disso). A resposta do 'eu' vem sob a forma de irrequietude, concretizada em verbos de ação: "aplicar", "velejar", "arar". Esta identificação do sujeito poético com o "céu" ganha nuances mais específicas com o recurso à palavra "menstruação", símbolo maior do ser feminino e dos ciclos a que toda a vida, pelas leis da natureza, está sujeita. Contraposto ao firmamento, temos a superfície, o "quintal", o solo onde se acende uma "lamparina na varanda", ou o "oceano" do "pensamento". O mais alto e o mais baixo, o sublime e o terreno, a ausência e a presença – numa revisão do platonismo, que não se deixa encerrar numa redoma intelectual, mas ao qual se responde com uma delicada sensualidade. Assim se passa com o convite para o amor dirigido a um "tu", para se "sujar com cores ímpares" ou para entrar no "portão já [que] está florido / para o eco dos seus dedos", uma belíssima imagem subliminar do encontro dos amantes. O "eu", vazio por dentro, mas preparado para o amor ("florido"), espera o toque do amado e no "eco dos seus dedos" pressentimos a antecipação de uma nova ausência, de um novo vazio, de novas recordações, repetindo-se o ciclo solidão/encontro. Basta, no fundo, "algo para ansiar", mesmo que esse momento de envolvimento amoroso seja fugaz e permanentemente "adiado".
Criado em: 23/6 8:35
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Re: Comentário a "Cores ímphares", de Vania Lopez |
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Da casa!
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14/6 14:54 Mensagens:
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Poema lindíssimo.
Análise excelente. O silêncio de giz: de tão difícil ontologia.
Criado em: 23/6 12:55
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Re: Comentário a "Cores ímphares", de Vania Lopez |
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Membro desde:
28/7/2009 9:35 De
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Magnífica análise a um poema também excelente, duma Poeta que sempre deixa o leitor com água na boca.
Li com gosto, deixo minha admiração, agradeço aos dois Poetas o prazer que me foi dado de poder-vos ler.
Criado em: 25/6 6:38
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Na plenitude da felicidade, cada dia é uma vida inteira. Johann Wolfgang Von Goethe |
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Re: Comentário a "Cores ímphares", de Vania Lopez |
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Membro de honra
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25/1/2009 12:13 De Pouso Alegre - MG
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Benjamim, você faz qualquer palavra sonhar. Me sinto honrada por olhar tão profundo. Mal sei agradecer, vou ficar devendo. Posso? Bjs
Agradeço os olhares e palavras, que por aqui demoraram. Bjs
Criado em: 26/6 1:13
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Devo confessar que sou o contrário, meus passos seguem em contrário. Sou uma pessoa inquieta, vou onde meu vento me leva. Artista Plástica e escritora, as vezes sem saber se pintoraqueescreve ou escritoraquepinta... Procuro por algo, mas a intenção n... |
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Re: Comentário a "Cores ímphares", de Vania Lopez |
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Administrador
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2/10/2021 14:11 Mensagens:
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Caros amigos, muito obrigado pelos comentários. Parabéns, Vania, pelo belo poema, que me proporcionou tanto prazer a ler e analisar.
Criado em: 26/6 8:55
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